por
Romero Venâncio
O documentário: “Alphaville – do Lado de dentro do muro” (Luiza Campos, 2009) relata o dia a dia de moradores dos condomínios de Alphaville, Cidade vizinha de São Paulo onde os grandes muros dão aos seus moradores uma “incrível” sensação de segurança e até mesmo um certo distanciamento privilegiado de seus vizinhos. Alphaville é um recorte de um estilo de vida do lado de dentro do muro. O retrato de um brasil cercado, onde supostamente é mantido longe o perigo, as interações indesejadas, todo tipo de movimento, heterogeneidade e imprevisibilidade das ruas. Em resumo, o filme é isto. Pela boca de uma moradora: “besta”, “malandro”, “um resto de sociedade, um infeliz”… O mundo fora de Alphaville é visto assim. O filme é o tempo todo com depoimentos nesta linha. Segurança, tranquilidade, porto seguro, longe do perigo… O contrário da São Paulo descrita por todos/todas. A referência a São Paulo (que está a poucos minutos!!!) é sempre degradante: perigo, assalto, feiura, roubo, medo, tragédia… Depois vem o que a câmara no faz ver: “pessoas bonitas”, bem alimentadas, falantes, “inteligentes”, supostamente educadas, sempre espiritualizadas (sem deus algum), brincando com animais domésticos, casas decoradas modernamente… Pessoas brancas e de padrão de classe média (alta) ou ricas mesmo, sendo direto. O recorte de um brasil minoritário em todos os sentidos. Impossível não lembrar do filme: “Um lugar ao sol” (Gabriel Mascaro, 2009) – um documentário que aborda o universo dos moradores de coberturas de prédio das cidades de Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. O diretor obteve acesso aos moradores das coberturas através de um curioso livro que mapeia a elite e pessoas influentes da sociedade brasileira. Impressionante como os depoimentos são parecidos em “estilo” e “conteúdo”. O tempo inteiro se justificando porque mora ali, porque é preciso viver ali e assim ou assado, culpa deus e o mundo por morar naquele lugar… Ninguém tem culpa de nada. A culpa é da abstração chamada sociedade. Privilégio na boca dessa gente é direito. Eles têm direito(s). Jamais se sentem responsável por nada.
Acredito que tenha sido de propósito o que fez a diretora com a cor: um branco quase estourado e onipresente em tudo que aparece. Acredito que foi uma estratégia.
Chama a atenção um momento do filme em que acontece uma quebra nos depoimentos fantasiosos dos moradores: os detalhes de segurança do condomínio pela empresa e por seus protagonistas. Detalhe da segurança com o som tenso… e depois, o alivio. Volta a segurança, a alegria, a tranquilidade e o paradisíaco. O cotidiano topo o tempo no filme tem que aparecer como “extraordinário”. Disparou a câmara na cara dessa gente, tempos aquele sorriso, aquele afago, aquela alegria… Aquela aparência calculada. Eles descrevendo comida ou comprando por telefone é uma “delícia”. Um brasil (dos ricos) inteiro aparece transparente. Único. Como afirma um morador naquele estilo clássico de brincadeira de rico: “aqui nem é favela, nem Amazônia”. Eles têm consciência de uma coisa: cidade confortável é cidade segregada. E pronto. Toda a ideia de “cordialidade” deles é esta.
A diretora é Luiza Campos. Ela se apresenta como moradora de Alphaville e deverá ser por isto que pôde filmar. A câmera da diretora percorreu um cotidiano, ouviu bem os moradores, procurou imagens idílicas, festinhas, animais, arte, comida… Acredito que até sexo devem falar (os adultos, óbvio!). Poucos momentos de lucidez e de percepção crítica de onde vivem e o “lado de fora”. Mas como São Paulo não presta, o melhor é Alphaville mesmo. A diretora faz algumas poucas falas e perguntas. Mas nem precisava. As pessoas já são personagens perfeitas para este roteiro. Luiza quer nos fazer entender que toda esta exposição destas pessoas ricas é feita de um ponto de vista crítico. Ela termina o filme saindo de Alphaville e voltando à “vida real” de São Paulo que ela diz gostar. Ela até se deixar filmar comprando milho cozido na rua lotada de gente real (pra comer, suponho). Na minha opinião, aqui vemos o maior limite da visão da diretora: o esquema de nos fazer ver idilicamente Alphaville no filme quase todo o tempo é o mesmo olhar quando nos poucos minutos finais nos faz ver o que chama de “mundo real”. O clássico olhar rico sobre os pobres, sobre o povo… Sobre o mundo. A questão é de mentalidade e não de posição individual. Porém, vale muito ver este filme… Afinal, foi gente com esta mentalidade que em 2013… 2016… 2018… Veio às ruas, tomou o governo deste Brasil real e sem vergonha alguma, nos faz assistir nas redes sociais todos os dias este espetáculo de vida.
O documentário: “Alphaville – do Lado de dentro do muro” (Luiza Campos, 2009) relata o dia a dia de moradores dos condomínios de Alphaville, Cidade vizinha de São Paulo onde os grandes muros dão aos seus moradores uma “incrível” sensação de segurança e até mesmo um certo distanciamento privilegiado de seus vizinhos. Alphaville é um recorte de um estilo de vida do lado de dentro do muro. O retrato de um brasil cercado, onde supostamente é mantido longe o perigo, as interações indesejadas, todo tipo de movimento, heterogeneidade e imprevisibilidade das ruas. Em resumo, o filme é isto. Pela boca de uma moradora: “besta”, “malandro”, “um resto de sociedade, um infeliz”… O mundo fora de Alphaville é visto assim. O filme é o tempo todo com depoimentos nesta linha. Segurança, tranquilidade, porto seguro, longe do perigo… O contrário da São Paulo descrita por todos/todas. A referência a São Paulo (que está a poucos minutos!!!) é sempre degradante: perigo, assalto, feiura, roubo, medo, tragédia… Depois vem o que a câmara no faz ver: “pessoas bonitas”, bem alimentadas, falantes, “inteligentes”, supostamente educadas, sempre espiritualizadas (sem deus algum), brincando com animais domésticos, casas decoradas modernamente… Pessoas brancas e de padrão de classe média (alta) ou ricas mesmo, sendo direto. O recorte de um brasil minoritário em todos os sentidos. Impossível não lembrar do filme: “Um lugar ao sol” (Gabriel Mascaro, 2009) – um documentário que aborda o universo dos moradores de coberturas de prédio das cidades de Recife, Rio de Janeiro e São Paulo. O diretor obteve acesso aos moradores das coberturas através de um curioso livro que mapeia a elite e pessoas influentes da sociedade brasileira. Impressionante como os depoimentos são parecidos em “estilo” e “conteúdo”. O tempo inteiro se justificando porque mora ali, porque é preciso viver ali e assim ou assado, culpa deus e o mundo por morar naquele lugar… Ninguém tem culpa de nada. A culpa é da abstração chamada sociedade. Privilégio na boca dessa gente é direito. Eles têm direito(s). Jamais se sentem responsável por nada.
Acredito que tenha sido de propósito o que fez a diretora com a cor: um branco quase estourado e onipresente em tudo que aparece. Acredito que foi uma estratégia.
Chama a atenção um momento do filme em que acontece uma quebra nos depoimentos fantasiosos dos moradores: os detalhes de segurança do condomínio pela empresa e por seus protagonistas. Detalhe da segurança com o som tenso… e depois, o alivio. Volta a segurança, a alegria, a tranquilidade e o paradisíaco. O cotidiano topo o tempo no filme tem que aparecer como “extraordinário”. Disparou a câmara na cara dessa gente, tempos aquele sorriso, aquele afago, aquela alegria… Aquela aparência calculada. Eles descrevendo comida ou comprando por telefone é uma “delícia”. Um brasil (dos ricos) inteiro aparece transparente. Único. Como afirma um morador naquele estilo clássico de brincadeira de rico: “aqui nem é favela, nem Amazônia”. Eles têm consciência de uma coisa: cidade confortável é cidade segregada. E pronto. Toda a ideia de “cordialidade” deles é esta.
A diretora é Luiza Campos. Ela se apresenta como moradora de Alphaville e deverá ser por isto que pôde filmar. A câmera da diretora percorreu um cotidiano, ouviu bem os moradores, procurou imagens idílicas, festinhas, animais, arte, comida… Acredito que até sexo devem falar (os adultos, óbvio!). Poucos momentos de lucidez e de percepção crítica de onde vivem e o “lado de fora”. Mas como São Paulo não presta, o melhor é Alphaville mesmo. A diretora faz algumas poucas falas e perguntas. Mas nem precisava. As pessoas já são personagens perfeitas para este roteiro. Luiza quer nos fazer entender que toda esta exposição destas pessoas ricas é feita de um ponto de vista crítico. Ela termina o filme saindo de Alphaville e voltando à “vida real” de São Paulo que ela diz gostar. Ela até se deixar filmar comprando milho cozido na rua lotada de gente real (pra comer, suponho). Na minha opinião, aqui vemos o maior limite da visão da diretora: o esquema de nos fazer ver idilicamente Alphaville no filme quase todo o tempo é o mesmo olhar quando nos poucos minutos finais nos faz ver o que chama de “mundo real”. O clássico olhar rico sobre os pobres, sobre o povo… Sobre o mundo. A questão é de mentalidade e não de posição individual. Porém, vale muito ver este filme… Afinal, foi gente com esta mentalidade que em 2013… 2016… 2018… Veio às ruas, tomou o governo deste Brasil real e sem vergonha alguma, nos faz assistir nas redes sociais todos os dias este espetáculo de vida.